ENSINO DA ARTE NO BRASIL

12/03/2011 09:28

Sobre o ensino de artes no Brasil: notas para reflexão

Sobre os conceitos de cultura e arte: convergências

Marcelo Gruman*

Podemos dizer que “cultura” refere-se ao significado que um grupo social dá à sua experiência, incluindo aqui idéias, crenças, costumes, artes, linguagem, moral, direito, culinária etc. A cultura é dinâmica, se recicla incessantemente incorporando novos elementos, abandonando antigos, mesclando os dois transformando-os num terceiro com novo sentido. Tratamos, portanto, do mundo das representações, incorporadas simbolicamente na complexidade das manifestações culturais. Cultura não é acessório da condição humana, é sim seu substrato. O ser humano é humano porque produz cultura, dando sentido à experiência objetiva, sensorial. Afinal de contas, um macaco não é capaz de apreciar a diferença entre água benta e água destilada…

A cultura é pública porque o significado também o é. É fundamental atentarmos para o fluxo do comportamento, da ação social, através do qual as formas culturais encontram articulação. O significado aflora do papel que desempenha no padrão de vida decorrente. Fica marcado, portanto, o caráter eminentemente social das identidades. Ainda aqui, os membros escolhem aderir ao conjunto de práticas e crenças vinculadas a tal identidade, “a mais essencial de todas as criações ou invenções modernas”, nas palavras do sociólogo polonês Zygmunt Bauman.

Portanto, quando se diz que alguém “não tem cultura”, a referência é à sofisticação, sabedoria, de educação no sentido restrito do termo. Ou seja, pressupõe-se que o volume de leituras, controle de informações e títulos universitários equivalham à “inteligência”. A cultura em seu sentido antropológico, por outro lado, transcende a noção de refinamento intelectual (cujo adjetivo é “culto”, e não “cultural”). A cultura permite traduzir melhor a diferença entre nós e os outros e, assim fazendo, resgatar a nossa humanidade no outro e a do outro em nós mesmos. (DA MATTA, 1981). Ao seguirmos esta perspectiva, tornamonos mais respeitosos com relação ao outro porque este outro nada mais é do que nosso espelho, refletindo a unidade na diversidade. Para além da tolerância, perseguimos a
convivência e a harmonia.

Dar sentido à experiência, ao estar-no-mundo, representá-la através de símbolos e orientar os indivíduos uns em relação aos outros os dotando de máscaras sociais, de identidades, também é característica daquilo que entendemos por arte. Ela é cognição através dos sentidos. É uma área de conhecimento que opera com a organização imaginativa do sujeito a partir da experiência universal da humanidade e das experiências particulares de cada um, resguardados os princípios da unidade na diversidade, da harmonia na heterogeneidade e do equilíbrio nas diferenças (PEREIRA, 1993), consolidando-se como fator de humanização, de socialização e de fortalecimento da identidade cultural.

A arte é um meio de representação da realidade, uma construção social, percepção de nós mesmos no mundo possibilitando-nos assumir modelos de identidade e comportamento. Tais representações do mundo podem nos inspirar para a compreensão do presente e criação de alternativas para o futuro. Nos Parâmetros Curriculares Nacionais de 1997 a arte é definida a partir de expressões como “conquista da significação”, “experiência de apropriação”, “desenvolvimento da percepção estética”, “consciência do lugar no mundo”, evidenciando o papel ativo do indivíduo no processo de construção de sua(s) identidade(s), posição distinta daquela advogada pelo ensino de arte tradicional que sacralizava a figura do professor, dono do saber.

Situa-se a área de Arte dentro dos Parâmetros Curriculares Nacionais como um tipo de conhecimento que envolve tanto a experiência de apropriação de produtos artísticos (que incluem as obras originais e as produções relativas à arte, tais como textos, reproduções, vídeos, gravações, entre outros) quanto o desenvolvimento da competência de configurar significações por meio da realização de formas artísticas. Ou seja, entende-se que aprender arte envolve não apenas uma atividade de produção artística pelos alunos, mas também a conquista da significação do que fazem, pelo desenvolvimento da percepção estética, alimentada pelo contato com o fenômeno artístico visto com objeto de cultura através da história e como conjunto organizado de relações formais. É importante que os alunos compreendam o sentido do fazer artístico; que suas experiências de desenhar, cantar, dançar ou dramatizar não são atividades que visam distraí-los da “seriedade” das outras disciplinas. Ao fazer e conhecer arte o aluno percorre trajetos de aprendizagem que propiciam conhecimentos específicos sobre sua relação com o mundo. Além disso, desenvolvem potencialidades (como percepção, observação, imaginação e sensibilidade) que podem alicerçar a consciência do seu lugar no mundo e também contribuem inegavelmente para sua apreensão significativa dos conteúdos das outras disciplinas do currículo.

O ensino de artes no Brasil e a UNESCO: respeito à diversidade cultural

No dia 16 de novembro de 1945, em Londres, foi adotada a Constituição da recémcriada Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura – UNESCO. Em seu preâmbulo, fica clara a influência dos acontecimentos recentes da Segunda Guerra Mundial, quando se afirma que “a ignorância dos modos de vida uns dos outros tem sido uma causa comum, através da história da humanidade, de suspeita e desconfiança entre os povos do mundo, causando guerras” e que “a difusão da cultura, e a educação da humanidade para a justiça, a liberdade e a paz são indispensáveis para a dignidade do homem e constitui um dever sagrado que todas as nações devem preencher segundo o espírito de mútua assistência” (UNESCO, 1945:1). O propósito da organização era, e é, o  alcance, através de relações educacionais, científicas e culturais entre os povos do mundo, da paz internacional e da compreensão mútua. Pretendia-se, portanto, acabar com a arrogância etnocêntrica.

Mais de três décadas se passaram quando, em 1978, na Conferência de Bogotá, o plano elaborado para o período 1977-1982 deixava clara a importância do estudo de culturas regionais, muitas vezes fruto de combinações e ressignificações simbólicas entre o “dentro” e o “fora”, trazendo também a questão da diversidade cultural intra-social subestimada ou negligenciada no período pós-guerra mundial. Novamente vislumbramos a promoção da compreensão mútua como fonte de paz duradoura entre as nações:

a afirmação da identidade cultural por cada povo, seja ele politicamente soberano ou não, seja uma grande potência ou não, que disponha plenamente de recursos e técnicas ou que esteja ainda em desenvolvimento, é o fundamento do pluralismo cultural. O reconhecimento e o respeito por tal pluralismo, à igualdade de direitos e à dignidade, aparecem hoje como um fator de paz e de compreensão entre as nações (UNESCO, 1977:11)

A idéia de que o pluralismo cultural poderia ser a “essência mesma da identidade cultural” questionava a imagem tradicional de Estados culturalmente monolíticos e introduzia a noção de “cultura da mestiçagem”, chegando-se à conclusão de que “a diversidade cultural dos povos deve ser considerada como fator de equilíbrio e não de divisão”.

Em 1982, ocorreu a Conferência MONDIACULT, na cidade do México, marcando significativamente a trajetória da UNESCO em suas atividades levadas a cabo no âmbito da cultura ao longo da década de oitenta. A Declaração do México sobre Políticas Culturais continha uma definição de cultura e uma explicação de seu papel:

Em seu sentido mais amplo, a cultura pode, hoje, ser considerada como o
conjunto de traços distintivos, espirituais e materiais, intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade ou grupo social. Ela engloba, além das artes e das letras, os modos de vida, os direitos fundamentais do ser humano, os sistemas de valores, as tradições e as crenças. (UNESCO, 1982:39)

Quase duas décadas se passaram quando, em 2001, foi elaborada a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural. Nela, logo em seu artigo 1º intitulado “diversidade cultural: herança comum da humanidade” é reforçada a idéia de que a cultura toma diversas formas ao longo do tempo e do espaço e que a diversidade está incorporada na unicidade e pluralidade das identidades grupais e societárias que representam a riqueza simbólica da humanidade. Como fonte de troca, inovação e criatividade, a diversidade cultural é “tão necessária para a espécie humana quanto a biodiversidade é para a natureza”.

Talvez possamos considerar o artigo 2º da Declaração Universal sobre Diversidade Cultural como o “pulo do gato” para o estabelecimento de relações harmoniosas entre as nações e no interior delas, uma vez que, como visto acima, o paradigma do Estado-Nação culturalmente monolítico já havia sido questionado tanto pela UNESCO quanto por instituições acadêmicas. O ideal a ser alcançado é, portanto, o pluralismo cultural, que não deve ser confundido simplesmente com a diversidade de manifestações culturais, mas como conhecimento e respeito ao “outro”.

Eis a transcrição do texto do artigo 2º da Declaração Universal sobre Diversidade Cultural:

In our increasingly diverse societies, it is essential do ensure harmonious interaction among people and groups with plural, varied and dynamic cultural identities as well as their willingness to live together. Policies for inclusion and participation of all citizens are guarantees of social cohesion, the vitality of civil society and peace. This defined, cultural pluralism gives policy expression to the reality of cultural diversity. Indissociable from a democratic framework, cultural pluralism is conducive to cultural exchange and to the flourishing of creative capacities that sustain public life. (UNESCO, 2002:2)

O último documento produzido pela UNESCO no que se refere à questão da diversidade cultural foi a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, celebrado em Paris durante a 33ª reunião da Conferência Geral da Organização das Nações Unidas entre os dias 03 e 21 de outubro de 2005. O texto oficial foi ratificado pelo Brasil por meio do Decreto Legislativo 485/2006. No preâmbulo dos artigos, o texto recorda ao público leitor que a cultura e a diversidade cultural são, dentre outras coisas, uma característica essencial da humanidade; constituem seu patrimônio comum, a serem valorizados e cultivados em benefício de todos; ao florescerem em ambiente democrático, de tolerância, justiça social e mútuo respeito entre povos e culturas, são indispensáveis para a paz e a segurança nos planos local, regional e internacional; elementos estratégicos das políticas de desenvolvimento nacionais e internacionais; manifestam-se na originalidade e pluralidade de identidades; fontes de coesão social; se
fortalecem mediante a livre circulação de idéias e se nutrem das trocas constantes e da interação entre os grupos sociais.

Uma série de princípios chama a atenção para o fato de que nenhuma medida ou política destinada à proteção e promoção da diversidade de expressões culturais pode infringir os direitos humanos e as liberdades fundamentais como a de expressão, informação e comunicação, bem como a liberdade dos indivíduos se expressarem culturalmente. Os países que ratificaram a Convenção estão obrigados a promover em seus territórios a criação de um ambiente que encoraje os indivíduos e os grupos sociais a
criarem, produzirem, disseminarem, distribuírem e acessarem suas expressões culturais, bem como acessarem as demais expressões culturais dentro de seu território e de outros países do mundo.

Estudiosos de arte-educação afirmam que um dos poucos avanços educacionais no Brasil nos últimos anos foi a introdução da preocupação com multiculturalidade nas escolas, entendida como o reconhecimento de diferentes códigos culturais e de diferentes necessidades culturais, da necessidade de convivência entre culturas e dentro da mesma cultura (BARBOSA, 2002; AGUIRRE & JIMÉNEZ, 2009). Na escola tradicional, baseada na pedagogia neoclássica, valorizavam-se principalmente as habilidades manuais, os “dons artísticos”, os hábitos de organização e precisão, mostrando ao mesmo tempo uma visão utilitarista da arte.

As Orientações Curriculares para o Ensino Médio – Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, publicado em 2006 pelo Ministério da Educação, é um exemplo de como o tema da diversidade cultural entrou na agenda do Estado brasileiro quando o assunto é ensino das artes. O item 1.6, intitulado “diversidade e pluralidade cultural”, afirma que o ideário sobre o Ensino da Arte contempla as “diferenças de raça, etnia, religião, classe social, gênero, opções sexuais e um olhar mais sistemático sobre outras culturas”, denunciando, ainda, a ausência das mulheres na história da arte e nos seus circuitos de difusão, circulação e prestígio. Considera a educação especial, tomando o aluno de necessidades educacionais especiais como detentor de uma cultura de minoria no espaço escolar, pondo em pauta a necessidade de reforçar a herança estética e artística dos alunos de acordo com seu meio ambiente, e exige valores estéticos mais democráticos, chamado de alfabetização cultural: possibilitar que aluno desenvolva competências em múltiplos sistemas de percepção, avaliação e prática da arte.

Sugere o mesmo documento, em suas proposições referentes à “inclusão, diversidade e multiculturalidade”, que, embora a diferença exerça um papel decisivo nas relações interculturais, quando se “respeita” ou se “aceita” de maneira passiva, corre-se o risco de se ter uma mera atitude de “tolerância”, pois já há a suposição de que há um lugar superior a ser ocupado. Como no ensino da Arte ainda vigoraria o padrão eurocêntrico, seria necessário questionar os jogos de poder que legitimam as diferenças como verdades artísticas, estéticas e culturais.

O raciocínio presente aqui é semelhante ao apresentado nos documentos da UNESCO, quando se advoga a mudança de percepção da sociedade contemporânea, não tanto diversa quanto plural, cujos fluxos simbólicos são constantes e não respeitam supostas fronteiras de identidade intransponíveis. Distinguem-se, aqui, dois sistemas educativos: multicultural e intercultural. O primeiro faz referência à natureza culturalmente diversa da humanidade, o que se constitui como primeiro passo para avançar na qualidade dos currículos educativos, mas não suficiente. A educação multicultural de corte reformista, por exemplo, se limita a introduzir mudanças nas velhas configurações curriculares para
favorecer o encontro cultural. Recebeu inúmeras críticas, porque simplesmente acomodaria as diferenças. Fazer da “tolerância” o foco dos programas educativos não só não rompe o jogo de hegemonias, como mascara a manutenção dos privilégios de “raça” e classe. O conceito de interculturalidade avança mais, referindo-se às relações entre os distintos grupos culturais e sua evolução no tempo, e definida como “a presença e interação eqüitativa de diversas culturas e a possibilidade de gerar expressões culturais compartilhadas, adquiridas por meio do diálogo e de uma atitude de respeito mútuo” (UNESCO, 2006).

Somos humanos porque somos seres produtores e produtos de cultura, porque construímos socialmente nossa realidade, porque arbitrariamente damos sentido à nossa existência. Esta existência e seus valores são representados simbolicamente de diversas maneiras, uma delas sendo a atividade artística. Como muito bem coloca Verônica Fajardo (2001), o patrimônio cultural intangível de uma nação, composto pela dança, pela arte e pela música, deve ser entregue às crianças desde pequenos, enquanto ainda têm a capacidade de surpreenderem-se com o mundo. Introduzi-las num contexto artístico equivale a dar-lhes a capacidade de apreciar o que os outros estão criando e, ao fazê-lo, se lhes está ensinando o que é a criatividade. Ensinar sobre a arte é, portanto, ensinar sobre a vida. Enquanto conhecimento, deve ser praticada e ensinada nas escolas, ser parte integrante dos currículos. É esta a recomendação que encontramos nas Conclusões do Congresso Iberoamericano de Educação Artística: sentidos transibéricos, ocorrida na cidade portuguesa de Beja
em 2008:

As artes são essenciais para o conhecimento. Como são praticadas por todas as sociedades e são elementos determinantes da cultura e do desenvolvimento psicossocial do indivíduo, devem ser parte integrante de todos os currículos educativos, não como um elemento marginal ou externo ao sistema educativo. Assim, a Educação Artística (incluindo as artes plásticas, música, teatro, dança etc.) deve estar integrada como uma das áreas curriculares essenciais da Educação. Como estratégia de reação ante um crescente tecnocentrismo dos currículos educativos é necessário retomar o valor das emoções, posto que são elas que nos orientam em direção ao demais e porque verdadeiramente nos conferem a humanidade. Como reação à negação da Escola em relação ao papel dos sentimentos na formação dos futuros cidadãos é preciso que o afetivo, o emotivo, o biográfico, o subjetivo, adquiram de novo um lugar essencial nacotidianidade das aulas.

Parceria entre Ministério da Cultura e Ministério da Educação na execução do Programa de Educação Artística, Cultura e Cidadania: perspectivas

A aprendizagem da arte e da cultura nas escolas constitui uma das estratégias mais poderosas para a construção da cidadania cultural, expressão que diz respeito à superação das desigualdades, ao reconhecimento das diferenças reais existentes entre os sujeitos em suas dimensões social e cultural, pressupõe a participação em múltiplos contextos simbólicos, em múltiplos pertencimentos, em múltiplas identidades. A idéia de cidadania cultural se insere numa perspectiva democrática e toma os indivíduos não como consumidores e contribuintes, mas os considera como sujeitos políticos. A cultura é vista como direito dos cidadãos, e nessa medida eles têm o direito à informação, ao debate e à reflexão; o direito de produzir cultura; o direito de usufruir os bens da cultura; o direito à invenção de novos significados culturais; o direito à formação cultural e artística; o direito à experimentação e ao trabalho cultural crítico e transformador. Reconhece-se que a cidadania também se constrói a partir do respeito às formas como os indivíduos se vêem e, mais ainda, querem ser vistos pelos outros.

A Organização dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI) dedica parte de suas ações ao fortalecimento dos vínculos entre educação e cultura no âmbito dos sistemas escolares. Para tal fim, foi estabelecido este objetivo estratégico no marco de seus programas educativos e culturais. Trata-se de um desafio a alcançar tanto no âmbito formal como no não-formal e ao que devem responder de maneira coordenada os Ministérios da Educação e da Cultura, junto com organismos e entidades vinculadas à sociedade civil, com o fim de gerar espaço de apoio à construção da cidadania cultural e à formação de públicos para as artes.

Na X Conferência Ibero-Americana de Cultura, realizada em 2007 no Chile, os ministros ali reunidos comprometeram-se a desenvolver um programa ibero-americano de educação artística, cultura e cidadania fomentado pela OEI, que incorporasse à educação o conhecimento das diferentes linguagens e expressões artísticas e a importância da diversidade, do patrimônio e dos bens culturais nacionais e iberoamericanos. Um dos principais objetivos do Programa de Educação Artística, Cultura e Cidadania, sistematizados após a XII Conferência Ibero-Americana de Ministros da Cultura, realizada em 2009 em Lisboa, é o reforço da relação entre arte, cultura e educação, permitindo o conhecimento e valorização da diversidade cultural iberoamericana e o desenvolvimento da cidadania.

Nas conclusões da Segunda Reunião de Representantes Ministeriais e Especialistas Ibero-Americanos em Educação Artística, Cultura e Cidadania (Bogotá, setembro de 2009), os dezesseis países presentes reafirmaram a importância da articulação de ações através dos Ministérios da Educação e da Cultura no sentido de impulsionar a educação artística em seus respectivos territórios. Todos eles reconhecerem a necessidade de “estreitar as relações entre os entes governamentais de cultura e educação. Ainda que em diferentes ritmos e em diferentes medidas, logrou-se
que os Ministérios da Educação e da Cultura fomentem ações conjuntas de trabalho em educação artística”.

Esta preocupação com a articulação entre os ministérios já estava expressa na Declaração de Bogotá sobre Educação Artística (2005), quando os participantes da Conferência Regional da América Latina e Caribe Latino se comprometeram a incentivar a participação de artistas, portadores de tradições e promotores culturais no ensino fundamental e médio no sentido de enriquecer a expressão criativa das diferentes linguagens artísticas bem como propiciar o trabalho coordenado entre instituições de cultura e educação de cada país com o fim de implantar políticas e ações para o desenvolvimento da educação artística.

Neste ano de 2010, na Cidade do México, os representantes dos ministérios da Cultura e Educação reunidos no Encontro Ibero-Americano de Educação Artística e Cultura – convocado pela Secretaria de Educação Pública, Conselho Nacional para e Cultura as Artes, o Instituto Nacional de Belas Artes e a Organização de Estados Ibero-Americanos – refletiram sobre o papel da educação artística na formação de crianças e jovens e trocaram idéias das quais derivam propostas e recomendações, dentre as quais
destacam-se o respaldo ao Programa de Educação Artística, Cultura e Cidadania; a promoção de programas que fortaleçam os vínculos o setor educativo e o setor cultural; a promoção à aproximação de crianças e jovens à arte e à cultura desde espaços educativos formais e não-formais; criação de redes tanto do setor público como da sociedade civil, que vinculem educação com arte e cultura; a difusão de experiências exitosas realizadas por grupos e pessoas relativas à formação artística, assim como compartilhamento e difusão das boas práticas através de redes, materiais ou a web1.

1 Em 2009, MinC e MEC lançaram, no âmbito do Programa de Educação Artística, Cultura e Cidadania, o edital Convocação Nacional de Experiências Significativas em Arte/Educação, Cultura e Cidadania, com o objetivo de identificar e dar visibilidade às experiências que estão sendo desenvolvidas no campo da arte/educação (artes audiovisuais, dança, teatro, música), com especial referência àqueles que promovem o conhecimento das diferentes culturas e a formação de cidadãos preparados para viver

No Roteiro para a Educação Artística, documento elaborado por ocasião da
Conferência Mundial sobre Educação Artística (Lisboa, 2006) foi explicitado que cultura e arte, como direito universal, são componentes básicos de uma educação integral que permita o desenvolvimento pleno do indivíduo. Este é, portanto, um desafio posto ao Estado brasileiro, garantir o cumprimento do direito humano à educação e a participação na cultura. Cabe às instituições governamentais responsáveis pela gestão de programas diretamente relacionados ao objetivo mencionado zelar por seu cumprimento, os Ministérios da Educação e Cultura que, após mais de vinte anos de “divórcio”, reataram laços que nunca deveriam ter sido rompidos.

Cabe à Funarte, como gestora das políticas públicas do Ministério da Cultura na área das artes, a representação do país na discussão sobre arte, cultura e cidadania no âmbito da Organização dos Estados Ibero-Americanos. As discussões e deliberações aí tomadas refletirão diretamente nas ações da instituição, responsável pela promoção, incentivo e amparo, em todo o território nacional e no exterior, da prática, do desenvolvimento e da difusão das atividades artísticas e culturais nas áreas de artes cênicas, artes visuais, música popular e erudita. Por outro lado, também é ela quem deve manter contato estreito com seus pares do Ministério da Educação, de modo a promover políticas públicas conjuntas que viabilizem as diretrizes construídas nos fóruns nacionais e internacionais.

* CEPIN/Funarte/MinC. Representante Ministerial na Segunda Reunião de Representantes Ministeriais e Especialistas Ibero-Americanos em Educação Artística, Cultura e Cidadania (Bogotá, setembro de 2009) e no Encontro Ibero-Americano de Educação Artística e Cultura (Cidade do México, outubro de 2010).

em sociedades multiculturais. As experiências selecionadas em cada país foram apresentadas no Encontro Ibero-Americano de Educação Artística e Cultura, na Cidade do México. O Brasil foi representado por dois projetos: Cinemação: uma idéia na cabeça, um celular na mão: práticas educomunicativas realizadas com as linguagens audiovisuais (Bahia) e Corpos em movimento exercitando a cidadania (Rio de Janeiro).

Bibliografia:


AGUIRRE, I. & JIMÉNEZ, L. Diversidad cultural y educación artística. In: JIMÉNEZ, Lucina; AGUIRRE, Imanol & PIMENTEL, Lucia G. (coords). Educación artística, cultura y cidadania. Madrid: Fundación Santillana/OEI. 2009.
BARBOSA, A. M. Arte e Inclusão. In: ANDRIES, André (org.) Caderno de Textos: educação, arte, inclusão. Volume 1 número 1. Rio de Janeiro: FUNARTE. 2002.
CONGRESSO IBEROAMERICANO DE EDUCAÇÃO ARTÍSTICA: SENTIDOS
TRANSIBÉRICOS. 22 a 24 DE MAIO DE 2008. Beja, Portugal.
DA MATTA, R. Você tem cultura?. Jornal da Embratel. Rio de Janeiro. 1981.
FAJARDO, Verônica. Situación y desafios de la enseñanza del arte en América Latina y el Caribe. In: CONFERÊNCIA REGIONAL SOBRE EDUCACIÓN ARTÍSTICA EN AMÉRICA LATINA Y EL CARIBE. Métodos, contenidos y enseñanza de las artes en América Latina y el Caribe. Uberaba, Brasil. 2001.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Orientações curriculares para o ensino médio – linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília. 2006
________. Parâmetros curriculares nacionais. Brasília. 1997
PEREIRA, M. V. Ofício da FAEB ao Ministro da Educação e Desporto. Brasília. 1993.
UNESCO. Hoja de Ruta para la Educación Artística. Conferencia Mundial sobre la Educación
Artística: construir capacidades creativas para el siglo XXI. 6 a 9 de março de 2006. Lisboa,
Portugal.
________. Convenção sobre a proteção e a promoção da diversidade das expressões culturais. Brasília:
UNESCO, 2006.
________. Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural. Paris: UNESCO. 2002.
________. Planejamento de médio prazo, 1977-1982. Paris: UNESCO. 1997.
________. Mexico City Declaration on Cultural Policies. Paris: UNESCO, 1982.
________. Constitution of the United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization,
Londres: UNESCO. 1945.